Num cenário cada vez mais competitivo e economicamente delicado, os playbooks de Growth estão sendo reescritos. Para as marcas, isso exige estratégias ainda mais integradas e sustentáveis dentro de um contexto de multicanalidade.
Talvez 2022 seja lembrado como o ano em que tudo mudou para o crescimento.
Até então, growth era uma fórmula. De um lado, o venture capital injetando muito dinheiro em diversas empresas. Do outro, startups gastando esse dinheiro de um jeito semelhante, usando as mesmas estratégias de aquisição. Conquistar grandes bases de usuários era o nome do jogo -- e garantia um cheque mais gordo na próxima rodada de investimentos. A rentabilidade (a médio prazo) e a sustentabilidade do modelo (a longo prazo) mal entravam na conta.
Porém, não é mais assim que funciona. O cenário econômico incerto fez com o que o dinheiro ficasse mais escasso e os investimentos muito mais criteriosos. Ninguém consegue justificar um CAC altíssimo, nos patamares que eram praticados.
De repente, aquele jeito de crescer não funciona mais – nem para as startups, nem para os anunciantes tradicionais que seguiam as mesmas regras.
Um novo jogo para as marcas
O impacto dessa nova mentalidade para as marcas foi imediato. Por um lado, o apetite para o crescimento não diminuiu (todo investidor gosta de ler isso no report de resultados). Por outro, os investimentos ficaram mais restritos e a expectativa por resultados sólidos (que incluam lucro e rentabilidade) cresceu exponencialmente. Ao mesmo tempo, o cenário de canais não parou de se sofisticar e o nível de exigência dos consumidores continua crescendo.
Não é simplesmente fazer mais por menos. É fazer mais, melhor, mais integrado, para pessoas mais exigentes, contra concorrentes de ponta, em um cenário de mídia complexo e gerando lucro por menos.
Para as marcas, não existe ainda uma fórmula pronta para esse novo jeito de fazer growth (e provavelmente nem vai existir). Certamente, isso passa por uma abordagem end-to-end, que permita promover crescimento através de estratégias multicanal.
Para entender melhor o que isso significa, conversamos com um time multidisciplinar de especialistas da B&Partners, que apontaram caminhos claros para o crescimento das marcas. São pelo menos 5 questões-chave para crescer em 2023 que precisam estar no seu radar.
Redefina Crescimento como Progresso
O growth que importa em 2023 é que o torna negócios mais fortes, competitivos e sustentáveis para o futuro. É menos sobre quantos usuários acumulamos semana passada e mais sobre quanto avançamos a visão do negócio. Menos sobre aceleração e mais sobre progresso. Essa diferença pode parecer semântica, mas vai muito além disso. Por exemplo:
Lealdade volta a ser importante. Desde que "How Brands Grow" foi lançado, o marketing mergulhou com todas as forças na ideia de que só se cresce conquistando penetração. Fidelidade era algo secundário, mas isso já mudou. Segundo pesquisa da Antavo, mais de 70% planejam reformular seus programas de fidelidade nos próximos anos. Outra evidência é o crescente investimento em comunidades de marca e brand NFTs.
Geração Z busca relações mais significativas. De acordo com Pew Research Center, mais de 60% dos adolescentes americanos afirmam que se sentir “bem-vindo e seguro” online é mais importante do que ter um espaço onde possam falar livremente. Para eles, a conexão em círculos menores e mais íntimos faz mais sentido (eMarketer) e isso está redefinindo as mídias sociais. As marcas precisam aprender a contribuir e fazer parte dessas comunidades.
ESG como driver de crescimento. Engana-se quem pensa que a sustentabilidade está limitada somente à questão ambiental. Ainda que a questão climática seja urgente, o ESG já é um tema forte em Wall Street e os grandes fundos estão olhando para isso. É praticamente um top down de quem tem muito dinheiro. Growth e sustentabilidade vão andar cada vez mais próximos, apostam Daniel De Tomazo e Dilma Campos, respectivamente Chief Strategy & Data Office e Head de Diversidade e Inclusão e ESG da B&Partners.
Segundo o Loyalty Report 2022, o alinhamento com o propósito da marca mais que triplica a chance dela ser recomendada e aumenta em quase 10x a retenção e o gasto do consumidor. A mesma pesquisa mostra que os maiores drivers de lealdade são tratar seus funcionários de forma justa, priorizar a sustentabilidade e apoiar a igualdade.
Lealdade, Geração Z, ESG... nenhum desses termos estava nos playbooks de crescimento dos últimos anos. Sinal de que precisamos de novos manuais.
Garanta uma Estratégia Integrada
Por falar em manuais, essa nova realidade do crescimento muda radicalmente o jeito de se pensar estratégia. Antes, growth tinha a ver com aplicar um playbook -- avalie seu site, construa um blog, espalhe calls-to-action e por aí vai. Ou, talvez, com hacks: pequenos truques ou experimentos capazes de melhorar a conversão. Tudo isso continua tendo valor, mas simplesmente aplicar esses modelos não é o suficiente.
A cada dia surgem novas ferramentas, canais e possibilidades. De acordo com Gerson Ribeiro, Executive Director da Vitrio, uma estratégia integrada é a melhor resposta para lidar com essa complexidade. Entender como todas essas coisas funcionam juntas:
Garante consistência. Quando a conexão entre iniciativa de marca e performance, de on e off, do produto A e B são frágeis, a proposta de valor do negócio fica enfraquecida, avaliam Albano Neto, VP de Estratégia, e Carolina Vanucci, Partner & VP Business, da Score. Uma estratégia integrada de modo mais consistente evita enviar mensagens conflitantes para os consumidores.
Melhora a rentabilidade. A integração da estratégia traz muitos ganhos de eficiência. Esforços duplicados são eliminados e cada ação individual é potencializada pelo todo.
Aumenta a conversão. Se por um lado a estratégia integrada evita duplicidade, ela também diminui os buracos da jornada -- por exemplo, canais importantes que não foram cobertos ou mensagens que não "fecharam o loop".
Na prática, o recado é: quem deseja crescer em 2023 tem que deixar o playbook um pouco de lado, entender o seu consumidor e pensar numa estratégia end-to-end, ajustada para sua jornada.
Aprenda com quem Cria
Toda essa complexidade traz enormes desafios para a criatividade. E a melhor referência para como ser criativo nesse contexto não vem de nenhuma marca, mas do universo de criadores. Para Patrícia Calil, Head of Content and Insights da Snack, ninguém, melhor do que eles, sabe usar as plataformas a seu favor e tem coragem para experimentar novas ideias e formatos. Crescer em 2023 passa por aprender a pensar como creator, e isso inclui:
Criar para uma atenção cada vez mais escassa. O formato de mídia dominante nas redes sociais é o vídeo de 15 segundos, mas o tempo de atenção ativa de uma pessoa da Geração Z é menos de 10 vezes do que isso -- 1,3 segundos (Yahoo and OMD).
Estabelecer um ritmo de produção mais ágil. Enrico Benetti, Co-CEO, CCO & Partner da BFerraz, avalia que as marcas se notabilizaram em produzir campanhas que poderiam estar na tela do cinema, mas ainda não foram tão bem sucedidas em se adaptar aos formatos mais crus do celular. Os Creators, por sua vez, operam com frequência. Todo dia um novo conteúdo, uma nova experiência, uma nova interação. Esse ritmo acelerado e consistente de publicação garante mais aprendizados e melhores ideias.
Nunca esquecer a importância da originalidade. Quando um conteúdo viraliza, não basta usar o meme pelo meme. É preciso que todos os envolvidos tenham uma visão compartilhada sobre o propósito e os principais atributos da marca para conseguir aproveitar esses momentos de uma forma autêntica e relevante.
As marcas que vão crescer em 2023 certamente já operam com estruturas e processos que saíram diretamente do mundo dos criadores. Quem não estiver preparado para comunicar com velocidade e autenticidade vai ter dificuldades de acompanhar a concorrência.
Aposte na qualidade dos Dados, não na quantidade
Não é de hoje que se fala na importância de investir em dados, mas existem diferentes percepções sobre o que é uma gestão de dados eficiente. Quem trabalha olhando para planilhas todos os dias, talvez ele já se considere data-driven, mas precisamos ampliar essa visão e pensarmos não só em quantidade, mas, principalmente, na qualidade. Pontos importantes para considerarmos:
Só coletar dados não resolve. Segundo Thais Cano, CBO, e Denys Fehr, CEO & Partner da Just A Little Data, a fase de coletar tudo o que é possível já passou, sendo preciso coletar com a máxima qualidade possível as informações que de fato vão impactar o seu negócio. Além disso, é necessário ter uma visão muito clara sobre como esses dados serão armazenados e tratados para garantir uma alta confiabilidade e velocidade de análises. Isso pode parecer básico, mas esse ponto ainda não é realidade para muitas empresas.
Fundo de funil não é o fim. Existe o ROI, a margem e outras ações que se somam para que uma conversão aconteça. Porém, as marcas não devem focar só em ações de fundo de funil, e sim um investimento em modelos de atribuição para que possa entender o que de fato converte esses clientes e seus consumidores.
Entender de gente é ir além dos dados. Para Kika Brandão, Head da Estúdio Eixo, os dados precisam romper as barreiras de crescimento regional, desprender do foco eixo São Paulo. Tem que trazer a visão regional, criativo, dado comportamental do consumidor para que se monte uma estratégia correta para cada região e assim atinja resultados.
Não Adie o Inevitável
Finalmente, existem coisas que já vem dando as caras nos relatórios de tendências há um tempo. A questão não é mais "se" essas tendências vão emplacar, mas "quem" vai sair na frente e quem vai ficar para trás. Duas delas chamam a atenção:
Live Shopping. Quase 40% de todo o comércio eletrônico na China já acontece hoje através do Live Shopping. João Ramirez, CEO e Partner da Live Cake, considera que a experiência humanizada, associada a gatilhos de compra certeiros, pode levar a conversão a patamares inéditos. É por isso que toda operação de e-commerce vai também incluir uma plataforma consistente de venda ao vivo. Quem começar primeiro, vai colher mais rápido.
Brand NFTs. A Web3 muitas vezes parece um conceito utópico, distante, mas não se engane: ela já é realidade. E, se marcas são comunidades, os NFTs são as comunidades da Web3. Não à toa, o maior programa de fidelidade do mundo (da Starbucks) está se mudando de mala e cuia e vai passar a ser totalmente baseado em tokens. A cada dia, a lista de marcas lançando NFTs só cresce. Para Mitikazu Lisboa, CEO & Partner da Enterchain, quem demorar muito pra entrar vai perder muita coisa -- dinheiro inclusive.
No fim das contas, ninguém mais vai conseguir sustentar um CAC altíssimo, mas todo negócio vai precisar tornar a sua visão ainda mais real. Não dá pra criar uma única estratégia e segui-la à risca, mas dá pra evoluir a estratégia com os aprendizados de cada ciclo. Não dá para continuar com os processos criativos de sempre, mas dá pra criar com mais agilidade, experimentação e colaboração. Não dá pra voltar a 1998 pra investir na Amazon, mas dá pra começar um Live Commerce ou criar um NFT de marca agora.
Dá pra crescer muito em 2023.
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